"Não é papel do indivíduo, preso na própria vaidade, determinar se prefere a justiça ou a injustiça; não é o seu papel decidir se a prudência ou a imprudência lhe agrada mais."
Ao ler as palavras de Russel Kirk
sobre o deserto educacional que existe hoje, percebi nitidamente que desde
criancinha fiz parte de uma escola denominada: escola positivista. Neste
ambiente, destaca-se dentre muitas coisas, a preocupação em aprender técnicas, a
excessiva preocupação com a socialização, e uma preocupação exagerada com
os certificados, os títulos e diplomas.
Fui ensinado nesta perspectiva e acredito
que grande parte de quem frequentou os bancos escolares nas décadas de oitenta
também passou por este ambiente doutrinário.
Além disso, outra característica do
ambiente escolar que frequentei era a indisciplina, hoje provavelmente está bem
pior. A indisciplina que hoje é percebida no ambiente escolar, às vezes
ultrapassa os limites das escolas indo parar nas delegacias, isto certamente
indica alguma coisa e são muitas as opiniões por aí.
Como não adianta apenas opinar sobre um
assunto sem antes tentar compreender o que acontece efetivamente, ou pelo
menos, entender parte desta realidade, buscar o que os grandes estudiosos dizem
pode ajudar.
Antes de ser uma mera desordem comportamental, a
indisciplina caminha ao lado de uma desordem da linguagem no meio educacional.
O que tem a linguagem com toda essa
estória? As artimanhas da linguagem são desvendadas por Russel Kirk, que
inicialmente vai diferenciar duas palavras muito usadas na educação, “valores”
e “significado”, estes termos atualmente são usados sem critério.
A transmissão de significado é uma
coisa, a transmissão de valores é outra bem diferente. Dissimular o uso da
palavra valor como sendo “norma”, “princípio”, “verdade” é um artifício dos
doutrinários positivistas, que negam existir qualquer significado moral de
caráter permanente e transcendente. Nos EUA o uso do termo “valores” educacionais
foi inserido pela escola instrumentalista, que pretende substituir as
pressuposições religiosas sobre a existência humana, que antes eram aceitas
como verdadeiras nas escolas.
“Um valor, da forma como os pedagogos
empregam o termo, é uma preferência pessoal, que gratifica talvez a pessoa que
a ele adere, mas que não tem nenhum efeito moral obrigatório para as outras.
‘Desde que a quantidade de prazer permaneça igual, boliche é tão bom quanto
poesia’ na famosa frase de Jeremy Bentham (1748-1832). Escolha os valores que
quiser, ou ignore-os todos: é uma questão do que dá, ao indivíduo, o máximo
prazer e a mínima dor.
Etiénne Gilson (1884-1978) nota que
os positivistas promovem deliberadamente o conceito de ‘valores’ porque negam
que as palavras, ou os conceitos por elas representados, tenham significado
real. Portanto a palavra ‘honra’ poderá possuir algum valor para alguns, mas
ser repelente para outros: na visão do positivista, a palavra ‘honra’ não tem
sentido próprio, pois não existe honra, sem desonra: tudo é na verdade sensação
física, agradável ou dolorosa. Se a ‘honra’ tem um valor ilusório, use-a; se
não gostas de ‘honra’, descarte-a.
“Foi-se o tempo em que cada criança
em idade escolar estava familiarizada como o catálogo das sete virtudes,
teologais e cardeais, bem como os sete pecados capitais. Os positivistas e um
bom número de outras pessoas negam, hoje, a existência desses sete pecados
capitais, ou qualquer outro pecado. Quanto às virtudes – ora, gostaríamos de
transformá-las em ‘preferências de valor’, sem imperativo moral algum para
sustentá-las; mas a justiça, a fortaleza, a prudência e a temperança não são
meramente ‘valores’; nem o são a fé, a esperança e a caridade. Não é papel do
indivíduo, preso na própria vaidade, determinar se prefere a justiça ou a
injustiça; não é o seu papel decidir se a prudência ou a imprudência lhe agrada
mais. É verdade, o indivíduo pode assim decidir e agir, trazendo danos a outros
e a si mesmo; mas é função da educação transmitir uma herança moral: ensinar que
as virtudes e os vícios são reais, e que o indivíduo não está livre para
brincar com os pecados conforme achar melhor.”
É muito
evidente que Russel kirk define muito bem o assunto, e estas palavras certamente estão além
de uma mera opinião, são frutos de estudos. E como estamos no país onde o
diploma vale muito, é importante lembrar que Russel Kirk possuiu muitos, foi
mestre em História pela Duke University
e doutor em Letras pela University of St.
Andrews na Escócia, também foi ao longo da vida agraciado com 12 doutorados
honoris causa.
Fonte: Russel Kirk. A
Política da Prudência, p 309. Editora: É Realizações.