“Mentira toda
ela. Mentira de tudo, em tudo e por tudo. Mentira na terra, no ar até no céu,
onde, segundo o padre Vieira (que não chegou a conhecer o Sr. Urbano Santos), o
próprio sol mentia ao Maranhão, e direis que hoje mente ao Brasil inteiro.
Mentira nos protestos. Mentira nas promessas. Mentira nos programas. Mentira
nos projetos. Mentira nos progressos. Mentira nas reformas. Mentira nas convicções.
Mentira nas transmutações. Mentira nas soluções. Mentira nos homens, nos atos e
nas coisas. Mentira no rosto, na voz, na postura, no gesto, na palavra, na
escrita. Mentira nos partidos, nas coligações e nos blocos. Mentira dos
caudilhos aos apaniguados, mentira dos seus apaniguados à nação. Mentira nas
instituições. Mentira nas eleições. Mentira nas apurações. Mentira nas
mensagens. Mentira nos relatórios. Mentira nos inquéritos. Mentira nos
concursos. Mentira nas embaixadas. Mentira nas candidaturas. Mentira nas
garantias. Mentira nas responsabilidades. Mentira nos desmentidos. A mentira
geral. O monopólio da mentira. Uma impregnação tal das consciências pela
mentira, que se acaba por se não discernir a mentira da verdade, que os
contaminados acabam por mentir a si mesmos, e os indenes, ao cabo, muitas vezes
não sabem se estão, ou não estão mentindo. Um ambiente, em suma, de mentiraria,
que, depois de ter iludido ou desesperado os contemporâneos, corre o risco de lograr
ou desesperar os vindouros, a posteridade, a história, no exame de uma época,
em que à força de se intrujarem uns aos outros, os políticos, afinal, se
encontram burlados pelas suas próprias burlas, e colhidos nas malhas da sua
própria intrujice, como é precisamente agora o caso.”
Fonte: ANTOLOGIA. Rui Barbosa. Editora Saraiva p.28
Conferência proferida na Associação comercial do Rio de Janeiro, em 8 de março de 1919, por ocasião da campanha presidencial em que teve como antagonista o senador Epitácio Pessoa.
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